sexto sentido

sábado, janeiro 24, 2004

Pedofilia, porquê ?

Tenho pensado muito no que leva determinados seres a terem comportamentos que a nós, comuns dos mortais, se nos afiguram como obscenos, imorais, indecorosos.

Tenho pensado muito no caso da pedofilia.
O que pode levar determinados seres humanos a olharem crianças como objectos de desejo sexual?
Não consigo sequer imaginar que pensamentos despoletam este tipo de apetências.

As crianças representam o que de mais puro e inocente existe entre nós, simples pecadores.

Uma criança feliz, desenha sempre paisagens verdes, repletas de flores, árvores, arco-iris e sóis radiosos.
Uma criança feliz sonha com passeios no campo, piqueniques à beira mar e mil e uma brincadeiras inocentes.

O sexo não entra, não cabe, no mundo maravilhoso da criança.

Há também as crianças infelizes que não desenham paisagens campestres, mas que sonham com elas. Que não fazem passeios, mas que desejam um futuro feliz. Que sonham reencontrar a família ou encontrar uma nova que os ame, que os estime, que lhes dê as condições necessárias para poderem desenhar paisagens verdes e sonharem com pique-niques à beira mar.

O sexo não é, não será a preocupação destas crianças.

Pergunto então: O que leva determinados seres a pensarem diferente?
A olharem para estas crianças e em vez de sentirem ternura, compaixão, carinho, enternecimento, aflorarem à sua mente os pensamentos mais perversos, depravados, viciosos, desumanos, malvados, ruins, cruéis, que se possam sentir em relação a seres puros?

Não sei, não consigo explicar, porque não consigo pensar assim. Está longe da minha natureza.

Será o sentimento de poder em relação a seres mais fracos? Será o sentimento de domínio sobre o outro?

Não sei, talvez. Talvez um psicólogo, um psiquiatra consiga explicar.

Porque, por muito que alguns digam que a pedofilia já existe na nossa sociedade há muito tempo. Que os romanos a praticavam, que algumas das nossas rainhas casaram com idades pré-adolescentes, não consigo encarar estes actos como normais.

Será então que existe amor nestas relações?? Será que os pedófilos alguma vez se apaixonaram pelos suas vitimas??

Num livro de Nabokov, um dos seus mais famosos, que relata a relação amorosa entre um intelectual de meia idade e uma adolescente de doze anos, Lolita, custa a ler aquelas páginas tão cruéis, tão realistas e tão insólitas ao mesmo tempo, que relatam e descrevem os sentimentos deste adulto, que aproveitando a vulnerabilidade de uma criança órfã se aproveitou dela durante mais de dois anos.

A determinada altura, quando Lolita, finalmente, se consegue libertar das garras do seu carcereiro, que lhe roubou a infância e que lhe ofereceu um futuro cheio de mágoas, Humbert Humbert o protagonista, o pedófilo, diz:

Seria um velhaco se dissesse, e o leitor um tolo se acreditasse, que o abalo de perder Lolita me curou da pederosis. A minha maldita natureza não podia mudar, por muito que mudasse o meu amor por ela. Em campos de recreio e praias, os meus olhos sombrios e sorrateiros continuaram a procurar, contra a minha vontade, a luminosidade de umas pernas de ninfita, os símbolos furtivos das aias em botão de Lolita.(), dois anos de monstruosa satisfação tinham-me deixado certos hábitos lascivos e eu temia que o vácuo em que vivia me pudesse empurrar para a liberdade da loucura súbita, se me visse confrontado com uma tentação ocasional, nalguma azinhaga, entre a escola e o jantar.

Nabokov consegue nestas quase 300 suculentas páginas dar-nos uma ideia do que pensa um pedófilo, de que sentimentos lhe perpassam a cabeça, e em determinadas alturas a sentir mesmo compaixão de tamanho desequilíbrio.

Mas, eu continuo sem perceber, sem conseguir compreender.

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